nascer antes de termo
No 219 são tão pequenos que a fragilidade toda da vida se concentra naquelas raríssimos centímetros quadrados de superfície corporal; alimentam-se aos bocadinhos pela sonda e pelo biberão minúsculo, dificilmente aguentam o calor e mal conseguem encher os pulmões de ar sem a ajuda de uma pressãozita positiva. As mãos minúsculas, tão finas. As perninhas que são quase só pele, uma pele praticamente transparente, coberta de penugem. Serão um dia fortes e robustos, homens e mulheres capazes de vencer se vencerem estes primeiros dias de prematuridade, de doença que não é bem doença, é só um "chegar cedo demais".
E quantas vezes damos por nós a pensar que não estamos prontos para isto. Há exatamente um ano, arrumava a vida toda numa mala e na cabeça o mesmo grito surdo: tu não estás pronta para isto. Não foi o sair de casa, não foi o mudar de cidade e de país e de traduzir tudo o que sou e o pouco que sei numa língua com o qual nem sequer estava à vontade. Não foi a evidência praticamente absurda de que agora tinha de ser cescida e fazer coisas de crescidos, como pagar contas e tratar de seguros e procurar um contabilista e construir a minha casa. Não.
Foi ao fim de duas décadas ser, finalmente, o que sempre quis ser. 20 anos a preparar-me psicologica e intelectualmente para este momento, para perceber que não estava pronta. Ter vidas tão minúsculas nas minhas mãos trémulas ou a respiração de uma criança a ser julgada pela acuidade do meu ouvido era algo para o qual não estava preparada, obviamente. Mesmo com todos os protocolos e vade-mecuns e médicos mais velhos a quem podia aceder não importa em qual momento, prescrever um fármaco ou decidir uma atitude era algo para o qual não estava pronta.
Mas sobrevivi, sem me dar conta sequer da fraqueza inicial. Como um recém-nascido prematuro que se agarra ao oxigénio, à sonda e ao leite materno enriquecido, ao calor da incubadora, aos cuidados minuciosos de quem o recebe; que aproveita todos os recursos disponíveis, cresce devagarinho, se vai libertando dos pequenos auxílios à sobrevivência, até ao dia em que tem alta, mais forte, mais vigoroso, independente dos cuidados especiais, e se pode finalmente lançar à vida ao mesmo ritmo que um qualquer outro a termo.
Um ano depois, cheguei às 40 semanas. Tenho um peso aceitável. Nada de sequelas na retina nem no tecido cerebral peri-ventricular. Alimento-me com o normal para a minha idade e peso. Estou pronta.
E quantas vezes damos por nós a pensar que não estamos prontos para isto. Há exatamente um ano, arrumava a vida toda numa mala e na cabeça o mesmo grito surdo: tu não estás pronta para isto. Não foi o sair de casa, não foi o mudar de cidade e de país e de traduzir tudo o que sou e o pouco que sei numa língua com o qual nem sequer estava à vontade. Não foi a evidência praticamente absurda de que agora tinha de ser cescida e fazer coisas de crescidos, como pagar contas e tratar de seguros e procurar um contabilista e construir a minha casa. Não.
Foi ao fim de duas décadas ser, finalmente, o que sempre quis ser. 20 anos a preparar-me psicologica e intelectualmente para este momento, para perceber que não estava pronta. Ter vidas tão minúsculas nas minhas mãos trémulas ou a respiração de uma criança a ser julgada pela acuidade do meu ouvido era algo para o qual não estava preparada, obviamente. Mesmo com todos os protocolos e vade-mecuns e médicos mais velhos a quem podia aceder não importa em qual momento, prescrever um fármaco ou decidir uma atitude era algo para o qual não estava pronta.
Mas sobrevivi, sem me dar conta sequer da fraqueza inicial. Como um recém-nascido prematuro que se agarra ao oxigénio, à sonda e ao leite materno enriquecido, ao calor da incubadora, aos cuidados minuciosos de quem o recebe; que aproveita todos os recursos disponíveis, cresce devagarinho, se vai libertando dos pequenos auxílios à sobrevivência, até ao dia em que tem alta, mais forte, mais vigoroso, independente dos cuidados especiais, e se pode finalmente lançar à vida ao mesmo ritmo que um qualquer outro a termo.
Um ano depois, cheguei às 40 semanas. Tenho um peso aceitável. Nada de sequelas na retina nem no tecido cerebral peri-ventricular. Alimento-me com o normal para a minha idade e peso. Estou pronta.
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