morto vivo morto #3
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A Margem *.
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Novamente
transladado, começou a achar que qualquer coisa de errado se passava. Ouvia a
música, aquela música fúnebre, que o incomodava. Havia também a voz do padre e,
a dado momento, ouviu o seu nome. Quis levantar-se, mais uma vez, mas estava
rígido, hirto, como se o seu corpo fosse apenas feito de ouvidos e olfacto e
mente. A pouco e pouco, iam-se encaixando as peças e quando, finalmente,
compreendeu que aquele era o seu funeral, aquela gente que chorava os seus
amantes predilectos e o padre que rezava a missa lhe estava a passar a
irremediável sentença de morte, entrou em pânico.
Quis
virar-se, agitar-se, abrir um olho, mexer um dedo, mostrar a alguém que talvez
estivesse a respirar, que a sua caixa torácica ainda mexia, que estava vivo!
Contudo, não havia um lábio, um cabelo, que mexesse.
Pouco
depois, incidia-lhe o sol na testa alva, e nem por isso esta aquecia. Era um
sol que o incomodava entre tamanho desespero. Caminhava para a morte, porque o
confundiam com um morto, mas não estava morto, não, não, não!
A
luz deixou, com um baque surdo, de brilhar. Era a escuridão que o envolvia num
pânico desolador, estava aterrado: as cordas roçavam como serpentes sibilantes
pela sua cama de dossel… tsss… tsss… tsss… e, depois, caíam a poeira, a terra,
as pedras. Acabara-se o sol.
Então,
subitamente, não sentiu mais nenhum aroma, não ouviu mais nada, não pensou.
Que
importa menos um? Não há significado a mais nem a menos.
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*Mesmo que não seja este o
nome que lhe deu o mágico.
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