da construção do ser


Liberdade para Criar

A ciência, qualquer que seja a área sobre a qual se debruça, é, indubitavelmente, uma das mais belas e úteis criações humanas. Todavia, a Humanidade deixou-se adormecer sobre a luz da ciência, ficando oculta na sombra de supostos intelectuais e eruditos que, pais da nova e adorada razão, nasceram assim das cinzas do que é hoje a literatura, a filosofia e a arte.

Foram descuradas as fontes que alimentavam a mente e, em consequência disso, esta componente mirrou qual semente esquecida sob os elementos exteriores (elementos esses transfigurados nos preconceitos que dissecam os temas em busca da sua raiz demasiado objectiva).
E dessas cinzas morbidamente abandonadas sob a alçada de artigos e tratados científicos, vão-se erguendo ideias feitas, lugares comuns, regras e leis e convenções e concepções tão tacitamente embutidas na sociedade actual, que até o próprio ensino das ciências se transformou numa parelha obtusa: esqueceram-se os “doutores” que as formalidades hoje leccionadas não surgiram de mentes cerradas e sisudas, mas de espíritos abertos e criativos.
Afinal, por que razão se incute às pessoas da nossa geração, ainda tão disposta a aprender, fórmulas e padrões de trabalho. Por que não, após uma breve exposição acerca de como fazer, deixar fazer? Porque se tornou, efectivamente, mais simples educar as mentes para não pensarem: pensar traz ideias e mudanças e, por vezes, estas alterações não agradam aos mais sábios, aqueles que já estão ressequidos pelo tempo, pelo que são incapazes de conceber algo mais do que aquilo que já foi concebido – porque um sábio nunca terá nem metade do valor de um ignorante com humildade suficiente para assumir as suas dúvidas. 
Assim, limita-se de tal forma o pensamento que cada jovem se vê obrigado a  suprimir a sua criatividade e a sua essência, deixando-se levar pela multidão uniformizada que segue a “música” do comum.
Contudo, mais preocupante não é a forma como se restringe a camada jovem, ainda em aprendizagem, é o modo como estes se encontram dispostos a aceitar tudo o que lhes dizem. Assemelhando-se a robots, iguais a tantas outras máquinas incapazes de se entusiasmar com o que quer que seja, desprezam tudo o que não seja suposto conhecerem, e admiram o banal: as insignificantes e comuns convicções.
Constrói-se, então, um pequeno exército condicionado, sendo este mesmo exército informe – qual grupo bokanovsky – aquele que, um dia, irá educar os filhos desta geração, o que, invariavelmente, se traduz num ciclo vicioso sem precedentes. 
É urgente uma lufada de ar fresco, uma predisposição geral para negar algumas regras impostas
pelos educadores, porém, os alunos têm de assumir a atitude humilde de acatarem ideias e ordens – o seu futuro depende de avaliações e considerações de terceiros – pelo que, talvez aqui, sejam também os professores, ou os educadores em geral, que estão errados; um adulto responsável constrói-se pelo erro e pela consciência de que está votado ao erro.
Não caia o leitor no engano de considerar que o nosso ponto de vista desdenha do trabalho de pessoas que todos os dias se esforçam para nos ensinar e orientar, ou que ambicionamos uma sociedade anárquica: apenas queremos mais liberdade para nos construirmos enquanto pessoas e evidenciar que a sociedade se organiza de uma forma que acaba por invalidar a própria ordem, pois tanta sincronia somente atropela e atrofia.
O que é certo é que, condicionada pelos adultos de hoje – e também pelos de amanhã – a cada dia que passa, a dicotomia responsabilidade/liberdade perde o seu sentido. Os estudantes não têm a liberdade necessária para errar e, desse modo, evoluírem e melhorarem.
Com esta disposição social incorre-se numa redução do ser humano; a razão já não é o suficiente e a ignorância relativamente à cultura tomou a massa anónima  que preenche as terras, tornando-se esta na força motriz que move o Mundo.
Não fará falta alguém que alerte e que mude o ciclo degradante em que nos encontramos? Fará sentido optar pela uniformidade em prol do conforto? 
Ora a sociedade incorre na lei do facilitismo, mas, assim, está a condenar-se o pensamento à apoptose e, com esta programada pelos doutos, condena-se a espécie à insignificância de outros seres: condenados a seguir o que por outros já foi pensado.

É contra tudo isto que nos insurgimos, e não contra a ordem social. Por isso, discorremos de tal modo contra este espírito que nos é imposto e ansiamos por liberdade para criar, para desenvolver ideias, para crescer; queremos ser “pessoas” e não “gente”, e aplicar o que aprendemos, dia-após-dia, com distinção e originalidade, por mais respeito que tenhamos pelas normas.

CENSURADO
Ana e Liane                                                                                                           

Comentários

estela santana disse…
Não poderia deixar de vos escrever. Desta vez, às duas! Pois subscrevo o que li! Aliás, já andava de mau humor por não ter tido acesso a este texto:)
Pois eu própria, que no meu estado forçado de "adulta", lá me vou conseguindo escapar aos carimbos e aos rótulos que os "doutores" insistem em me colocar; mas, parte de mim, "a não adulta" vai conseguindo enganar à ignorância dos que apenas vivem para o não avançar do raciocínio, apenas transmitido pelos doutos; e não, não me importo que me considerem a "miúda das sapatilhas"...
Fica uma palavra aos que tenho tido o prazer de ensinar qq coisita, tenho aprendido tantas coisas mais e muito mais importantes!
Aproveito para vos felicitar e agora poderia estar aqui toda a noite: pela vossa simpatia, carinho, pelas inúmeras gargalhadas e pela imensa cumplicidade, especialmente em assuntos delicados, como a necessidade evidente de emanciapção do género masculino e das senhoras da ciência! Mas especialmente, pela vossa humildade e coragem!
Por fim, sugiro que a quem sofra de "stress científico", nada como fazer uma boa Milha! Não custa quase nada e não é preciso pensar, basta correr!:)
Beijos sem fim!

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