diário gráfico #2
13 de dezembro de 2014
Tão egoístas somos que, mais do que a felicidade (pff, a felicidade, que importa isso? felicidade é a marca de luxo que ostento na testa) procuramos uma definição acerca de nós mesmos. Sei lá, o importante é que haja qualquer coisa interessante, impressionante a dizer sobre isto-que-somos a quem se cruza connosco; melhor, qualquer coisa que se desenhe na testa, no espaço entre os dois supra-cílios, mesmo abaixo da marca de luxo. Ali vamos, vaidosos, tão importantes - mesmo que não passemos de pó cósmico a orbitar em torno de um eixo, e outro, e outro… Moléculas cheias de si. Transbordantes, inchadas, prestes a estoirar, que estoiram. E ninguém vai dar pela nossa falta… Pó de pó a ser varrido pela memória volátil de quem nos faz promessas de amor eterno.
31 de dezembro de 2014
Amor eterno.
Ah, as gargalhadas. Mas é para sempre, juram. Forever. Até que chega o dia e sempre, tristeza, tem um fim. Quem diria.
5 de janeiro de 2015
Há dias que doem muito. O confronto com a verdade, coisa dura. Dias que doem muito. Doem pela suavidade com que o Universo se manifesta no curso plano (e tão certo! tão prometido era!) das coisas - curso sem mais vertigem, achava eu, tão ingénua.
Tenho a garganta torcida num nó de medo que é também comum a quem encontra o que achava ter perdido. E isto, para mim, é encontrar-me de novo perdida, desconfortável como acabo sempre por ficar. Tragam as arritmias, mialgias várias e febres de origem indeterminada. Da minha parte, o voo começou de novo.
10 de janeiro de 2015
Mas há tanto ruído! Tanta ladainha mole e tanta moralidade. As televisões e os jornais e as pessoas opinando em voz alta. Que me tragam um pouco de melodia: música, música! Seja jazz, blues, uma bossa-nova qualquer, um rock inebriado (mais ou menos psicadélico, mais ou menos esquizofrénico) e, em dias bons, até um pouco de pop. A clássica, o trance, os ritmos eletrónicos e os barulhos vários conjugados num só som. Só. Som. E eu e o mundo e o sossego da ausência de humanidade que me caiba nos olhos. Que prazer mais se não fechá-los? E caminhar tropeçando na calçada, rindo-me sozinha da minha falta de habilidade para expressar a explosão de emoções que todos os dias me devora. Sou presa fácil das vertigens desagregantes da vida e, olha, não escolheria outra forma de caminhar: sem jeito, sem glória, sem graça, como uma criança pequena que ainda ontem aprendeu a andar.
é pau é pedra é o fim do caminho
(...)
é a promessa de vida no teu coração