esta merda

EDITORIAL

Este sítio de bestas cruéis apelidadas de humanos.
Este sítio onde vivemos de cérebro mutilado.
Este sítio onde todos os dias se luta pela vida e se mata pelo silêncio, alegando credos sem propósito.
Quanto vales, voz? Quanto vales, pessoa? Quanto vale a amorfização do homem que criativamente cria e reinventa e, desperto para as tempestades da terra, as tenta desenhar e levar ao mundo das pessoas? Que se ri de si próprio! E por isso é condenado de forma tão bárbara, que o mais bárbaro não consegueria descrever. Dizemo-nos “sem palavras”.

Vale uma vida. Vale doze vidas. Vale todos os corpos e almas e cabeças pensantes, as famílias e os contextos sociais, a paz, o amor – o respeito!
Tudo porque tantas vezes somos quem simplesmente não somos: eu não sou o homem na ponta da minha arma, não sou a mãe que perde o filho ou o filho que perde o teto. Eu e tu nunca somos quem não somos, e é por isso que a desumanidade nos leva com tanta leviandade a premir este como tantos outros gatilhos. É das vidas dos outros que somos responsáveis, acima de tudo.

Pois que somos sempre pela Liberdade e por todos os conceitos ético-filosóficos que, no fim, não passam de armas de estética esquecidas em prol dos valores... Que valores? Ah, mas há os ideais! Ideiais que assassinam ideias, bestas de inimaginável brutalidade que se revestem de princípios para fingir a indignação; falam da manifestação da verdade como se suficiente para suprimir quem tem coragem de a denunciar.

Amigos, deixemo-nos de eufemismos e mentiras: somos responsáveis pelas vidas de todos e assassinos em igual medida; irremediavelmente cúmplices de todos os crimes. Porque o que aconteceu hoje em Paris acontece todos os dias em todos os lugares deste planeta; passivamente se permitiu que a violência (em todos os seus campos e apresentações) passasse a ser o prato principal da hora do jantar. Assim me deixo invadir por um pessimismo (vergonhoso, admito, mas que já me é característico) e ouso afirmar: talvez por ser povoado de seres que se acham os maiores de entre todas as espécies, esta Terra é, somando todas as parcelas, uma merda muito triste.

Hoje, condenou-se a Liberdade de Expressão. Levou-se a democratização dos princípios fundamentais do Homem ao mais baixo – e o pior, vos digo, é que esta foi só uma entre tantas outras. Somos reles por natureza: esta é a nossa condição. É assim desde sempre, como é que ainda não me habituei?

Talvez fosse hora, que já dizia Manel Cruz, num tempo pós-Ornatos:

Mãe, a vida é esta merda
Dela só o cheiro se herda
Trocamos sonhos por qualquer porcaria
(...)
In “Canção da Lua”, por Foge Foge Bandido

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